quinta-feira, 12 de janeiro de 2017

o amor é o fim do mundo

eu sempre sonho com ele, desde criança. vem pelo mar, quase sempre, mas às vezes explode descontroladamente em forma de lava, e nesse caso de nada adianta fugir pras montanhas.
mas essa noite foi diferente. pela primeira vez eu sabia que ele viria, mas não fugi nem tentei resistir.
eu quis ver o fim do mundo por dentro.
não havia muito som, ao contrário do que eu imaginava. aos poucos o mundo era um filme de nitrato que ia se queimando em microcamadas, e eu de olhos bem abertos enxerguei tudo através da lenta combustão. eu vi através do filme até que tudo virasse o nada, como se mergulhasse no mar de olhos abertos e depois fechasse continuando a mergulhar.
um sentimento inconfundível, mas novo. e ao mesmo tempo eu sabia que ele me rondou durante a vida inteira, como se esperando minha disposição pra ouvir o silêncio.
o extremo do desapego e o extremo do mergulho.
e tinha algo de feminino no fim do mundo, um feminino que vinha de dentro de mim. e de certa forma eu senti que o mundo me via de maneira recíproca, queimando como um filme em silêncio, na pequenez do meu olhar e na profundeza da minha entrega.

inês.

quinta-feira, 8 de dezembro de 2016

notícias recentes ou assembleia geral sobre o amor

procura-se a poesia das coisas que não tem nomes fixos. de modo que se possa dizer eu te amo e permitir qualquer desvio semântico possível entre os envolvidos. de modo que querer alguém bem fundo seja algo aceitável, considerando-se os equívocos que rondam o querer.
se eu digo, por exemplo, a palavra "branca", que ela possa se desdobrar naquilo que me conecta com a espuma, e que esse desvio silencioso faça-me perder a propriedade da branquitude e transforme minha voz em quase-pura entrega.
não seja mais proibido sentir e compartilhar o que se sente mesmo que em forma de tropeços de reflexos de ecos de escuridão de nada.
e que o medo se transforme na piada da vez, e que a valentia seja o vento que carrega nossas mais preciosas sementes.
a melancolia se direcione pras últimas coisas das quais não se conhece ainda o fim.
e tudo aquilo que se transforma por essência seja exposto sem piedade.
o perdão tomando o lugar do medo, a liberdade tomando o lugar do desejo, e, como única possibilidade e última esperança, o eu se dissolva naquela fumaça que no fundo sempre foi.
estamos aqui reunidos até quando e pra quê?

inês.

sábado, 1 de outubro de 2016

louca. bruxa. livre. lua nova

a lua renasce e a cada ciclo renascemos juntas. o tempo vai passando e aquela oscilação terrível entre o medo de ser só e o desejo de liberdade começa a se transformar em entendimento.
aquela pressão exigente e tóxica pra ser sugada pela lógica da propriedade e da famiglia vai se tornando uma porção de lamentos sonoros e visuais cada vez mais distantes e sem sentido.
e só me interessa o que pode voar. a matéria, também, mas etérea, também... coisa de fogo terra pedra água e vento.
o tempo vai passando e a encanação com a castração alheia começa a parecer uma bobagem ingênua. não me importa ser chamada de louca, nem mesmo a ponto de sentir pena. louco é quem está doente, quem se vende em troca de uma proteção frágil e falsa. um dia o vazio pega, e aí?
de olhos e ouvidos abertos pro mundo vou tecendo meu espaço energético. o resto vai ficando tão previsível e pequeno!
vejo tantas mulheres lindas e fortes perdidas em relações nas quais as pequenas belezas vão sendo engolidas pela carência e insegurança e se transformando em desrespeito, e começo a me esforçar pra perceber esse caminho o quanto antes e zelar pelo compromisso que tenho com meu próprio crescimento e minha liberdade. cada um está num processo nessa vida, e é preciso ter cuidado pra não confundir o maravilhoso gesto de se envolver no processo de outra pessoa por amor, e o ato de sair carregando frustrações por aí. isso dá cor nas costas.
mas o começo é por dentro, se tocando e se conhecendo. fazendo massagem nos próprios cabelos, olhando o fundo da garganta no espelho, passando a língua nos dentes, escutando o intestino, sentindo as escamas do caminho do útero, cheirando o próprio sangue de olhos fechados, apertando os peitos, usando o tato interno pra sentir os ares que entram e saem.
depois correr... deixar que os hormônios explodam e o coração venha bater na boca e em cada capilar sobre a pele... fazer latejar os músculos. cultivar sensações secretas, varrer a casa em silêncio pela manhã. depois voar... esquecer algumas coisas e perdoar tudo o que for possível. o amor só existe no perdão.
e que as palavras tenham seu poder reconhecido com mais ousadia e com mais cautela e generosidade. e que os sonhos não sejam imagens vãs. e que as folhas e as conchas sejam ouvidas. e que alguns pensamentos não sejam sufocados mas passem como nuvens. e que o corpo seja uma fonte, e que o desejo seja um fluxo, e que o encontro seja fluvial.


inês.



sábado, 17 de setembro de 2016

so rio

dentro de mim tem um bosque,

dentro de mim uma chama,

dentro de mim solidão.

dentro do bosque um rio,

dentro do rio uma luz
(só quem sabe fechar os olhos sabe disso).

eis que um príncipe de olhos fechados
(e cheiro doce no corpo todo)
ouviu o barulho desse rio lá de fora.

se o príncipe mergulhar ele morre
(coisa de encantamento?)
então ele fecha os olhos e escuta.

qualquer dia o príncipe vai seguir seu caminho
(vai deixar os seus passos no mato)

eu não vou seguir seu rastro.
vou ficar sentindo seu cheiro impregnado nas folhas.
até que o muro que cerca meu bosque se esburaque e se desfaça
e as aves que aqui cantam voem todas pra longe.

inês. e a lua vendo isso tudo.

segunda-feira, 1 de agosto de 2016

olhos essenciais de rosas e gerânios

deu-me a vida a graça de apreciar a arte dos encontros, sentí-los de tudo quanto foi forma e profundeza, até que a textura cromática entre mim e as outras pessoas começou a se estender de tal forma descontroladamente maravilhosa que muitas vezes um sorriso lá de mil novecentos e não sei quando me aparece agora num nascer de sol neste fim de semana que passou naquela cidadezinha da infância que graças a deus tornei a ver (e onde tomei a bênção de dona dalva, no mesmo dia em que ganhei um novo amor trazido pela lua dourada, que provavelmente ainda verei algumas poucas vezes na vida se tiver sorte, mas que também já tocou magicamente outros amores meus de outros carnavais, com os quais já troquei e continuarei trocando segredos mágicos pelo correr do tempo sabe se lá por onde). isso pra dizer de amores previamente livres. aqueles quase nunca eróticos, que passam por mim nesta vida em formato de professor, de quitandeira sabida, de alguém que viajou ao meu lado e compartilhou comigo alguns silêncios olhando pra um rio que só a gente sabe qual foi. nossasinhora. de saber que nunca mais vai se ver mas mesmo assim apertar a mão bem forte e falar só um podicrê bem sincero, de quem viu o passarinho verde, de quem tá indo cada um prum lado mas se ligou na viagem errada (quem viu a solidão bem dentro do fundo do olho um do outro, não só a solidão triste, mas a triste também, e deixou refletir um pro outro a sombra natural do medo e a luz deslumbrante da coragem).
aí, é claro, teve os encontros que passaram pelo corpo todo. teve de tudo. tirando a parte das ideias muito tortas, das inseguranças muito imaturas, que fazem parte do aprender a ser a gente e do constante se ajustar ao inconstante mundo... encontrar alguém que mexe com muitas partes de dentro e de fora da gente, de antes de agora e de depois, e que faz a gente ficar matutando sobre onde é que está o quê, e ao mesmo tempo se deixando enlouquecer um pouco, ai, isso é bom. principalmente quando a coisa não tem nome, ou quando tem muitos nomes, quando muda o tempo todo acompanhada de risada e de desejo. enigma sem pé nem cabeça, sem começo nem fim, ele se propõe meio tronxo, incompleto e ao mesmo tempo inteiro e eterno, frágil e disperso e ao mesmo tempo infinito. é um cisco, um sopro, um diamante. trivial e único, brutalmente livre e enigmaticamente sensível.
não sei de muita coisa. tem gente que não perde tempo. experimenta encontros incríveis com pessoas interessantes. em superlugares. bons papos. boa comida. mas sem apego! o mundo é grande e há muito o que conhecer. muitos lugares. muitas histórias. muitas pessoas. muitas culturas. muitas mulheres, muitos homens, muitos mistérios. eu espero que essas pessoas sejam felizes e realizadas assim.
eu aqui... desde o princípio... tenho ido devagarzim. quando sento pra prosear, é sem hora pra levantar. eu me entrego, e o milagre acontece. entregar-se de verdade mesmo é o contrário de se prender, é se libertar (e quem sabe ir até mais longe? não sei de muita coisa). ainda me sirvo do primeiro amor. e do segundo... e assim tem sido... e ó: num tenho do que reclamar não. o coração só cresce e aquece. porque se um grão de areia é amor então é ele que vai valer a minha vida inteira.

inês.
té logo, vai na frente que eu vou indo :)

quinta-feira, 12 de maio de 2016

flui

cá estou, cá fora, cá longe. de repente. sem fuga nem esconderijo.
alguma saudade - é verdade. convertida na mais pura ternura de quem não quer voltar nunca mais pra ficar.
a vida é assim mesmo, eu quero mesmo é isso aqui (ir).
(enfim, fui embora)
nada mais preso na garganta, mas muitos corações fora do peito.

sobre as ruas e janelas que cuidaram dos meus passos...
o respeito me liberte.

sobre o antes pouco, medíocre, pesado de inveja, o mau olhado, o controle, a sabotagem, o sem futuro...
a disciplina me liberte.

sobre aquele passado cercada de machos do passado, aqueles que tinham pavor da liberdade feminina, aqueles que não suportavam olhar uma mulher frente à frente...
o perdão me liberte.

sobre os amorzinhos, aqueles que de quem eu nunca mais vou sentir o cheiro...
o amor nos liberte.

sobre o novo, o grande e agora pra sempre sem fim...
a coragem me liberte.

braços abertos, fitando o atlântico (o passado e o futuro)
meu corpo na babilônia e no mato, na estrada, nas ondas, no céu...
viagem de cipó, passaporte, papo-reto...
novos amores, agora mais forte pra dizer "vem-que-tem" ou "vai-com-deus"
novos sinais, armadilhas, delícias, belezas e bênçãos...
a fé me libertou.

inês (eu tou ficando é mais velha, né mais boba não).

terça-feira, 10 de maio de 2016

tempo

lua cheia

sim, guiar o coração. por que não?
amores lentos, amores brutos... mentiras-olhares (silêncios-entregas). casos travados, casos esquecidos, guardados, amores metidos. casos perdidos.
promessas
apegos
desejos
perdão (liberdade)
- perfume-boemia-paumole -
- tesão-teoria-peloscheiros -
(o peito cheio)
novela. pé no cu. volta atrás. o revés, o urso-serpente, o trago, o engasgo, o cuspe o gozo o riso o sono
falo
grelo
carne-e-osso (chôro e flor)
a vela ainda acesa, o útero e a fome
a lua, a rua, o amor (soprando de novo).


lua nova

entre uma história mais bonita que a de Robson Cruzoé
olhos pesados e vazios, filha e pai (ou o contrário)
o futuro na beira do mar, eu e eu, dois navios em batalha colidindo
(ai, naufrágio novo, haja nunca-maises)
...
e trabalho mansinho
o olho tangente, menos fogo, mais veludo
(o medo olhando pra tudo, pedra e peixe, filho e mãe ou o contrário)
caminhada crua, vôo solto, a despedida, o broto de amor.
...
e lembrar de um lance aí, que chegou de outras vidas e não se sustentou
(dor e dor)
e pensar num troço aqui que me lambe a criança - filho ou eu?
(coisa de pele)

não sou eu quem me navega: forte à deriva
(dizer não a quem me suga: isso foi ser-forte)
vai-com-deus

a vida serenou, e nem sei mais se quem vai me matar é a beleza.
a mãe dos pecado capital é a vaidade
(e o maior feitiço ainda é o perdão)

flor, fruto, vôo livre, o tempo
(vai-com-deus).

inês.

domingo, 16 de agosto de 2015

recife mandou me chamar

há um lugar no mundo que jamais poderia ser conhecido por mim: quando nos encontramos, o que houve foi mais um reconhecimento, uma descoberta de algo que já corria no meu sangue desde antes de eu nascer. A cidade de Recife, no Brasil, recebeu meus antepassados africanos, e, durante séculos, drenou-se de seu suor e suas lágrimas, de seu sangue, e do açúcar que, escravizados, eram obrigados a produzir. Príncipes e princesas negros atravessaram o oceano e ali foram comercializados como se não tivessem alma. Mas seus corpos eram sagrados, e os orixás que os acompanharam até aqui refugiaram-se nas matas, nas pedras, nas folhas e no vento, de modo que, hoje, cada micropartícula da cidade do Recife vibra com sua força de um modo incontrolável. Se, por um lado, a opulenta arquitetura colonial consegue nos transportar a um passado de sofrimento, que jamais deve ser esquecido, sabemos que cada uma das pedras que ali foram erguidas foram, antes de mais nada, tocadas por esses nobres africanos. Passar pelas pontes sobre o rio Capibaribe e acompanhar o lento curso que vem trazendo as águas do Agreste Pernambucano, é ao mesmo tempo ser atravessado pela ventania ensolarada que o mar, logo ali, faz jorrar pela cidade. 
se a noite é um mistério que esconde histórias do mar, feitiços, pernadas de capoeira em esquinas vazias, o dia explode em cores e luz, delírios sonoros. Recife-Babilônia, que no carnaval transborda de frevos - orquestras enormes com ritmos quentes -, maracatus centenários que louvam o deus Xangô e fazem tremer as portas, as casas, os pés e o coração, e mais côco, caboclinhos, xote e baião, até que na melancólica quarta-feira de cinzas dissolve-se em bois encantados que descem a rua da Boa Hora em Olinda, despedindo-se da cidade em retorno para os interiores do estado.
no mercado, os peixes, as carnes salgadas, os frutos coloridos, o fumo, o couro de bode, as folhas mágicas que índios e negros conhecem e vendem, panelas, castanhas, cabaças, histórias de cordel, política, poesia, segredos, receitas... tudo se mistura pelas bancas e ruas e portas, num misto de grito e segredo, de cheiros que se reforçam e se disfarçam: o mercado é um eterno encontro e uma eterna procura.
por trás da cidade, o mar. A mãe cristalina que oculta cavernas, corais, tubarões e silêncios. Onde o mangue sobrevive ainda e estala, homens-caranguejo procuram mariscos, prostitutas pobres vendem sua sorte e seres confusos se drogam escondido. Crianças sem medo arrancam as roupas e mergulham entre ondas.
aqui e ali, oferendas sagradas. Flores, velas, bebidas, galinhas, esperam nas encruzilhada que o deus Exu as aceite. Senhoras espreitam pelas janelas o olhar das pessoas que se apressam nas ruas. A fala do povo é cantiga, paisagem sonora. Não se diz "me dê um beijo", mas sim "me dê um cheiro". Resistindo à violência ainda colonial do Progresso e da ordem, deuses guerreiros dão força aos corpos que lutam diariamente, e deusas de fecundidade confortam suas filhas. Há em Recife um passado sagrado que se alimenta de vida, de modo que, ali, é impossível sentir-se só. Aparentemente confusa, a cidade se conecta, o sol acelera os gestos e a fala, o vento organiza, o mar abençoa. Sentimos tudo vibrar, por dentro e por fora.

inês


segunda-feira, 9 de março de 2015

línguas

palavra fere (palavra-arma). da fala que prende, quero o que cala. quero o som que voa, a palavra do corpo que sopra e que é poesia: olhos que se encontram e degustam seu reverso (olhar é verso), dedos que navegam no mar da pele (esse mundo do outro, que palavra repele), sangues que movem carnes e unem mundos, almas que voam pra fora de si. quero desejo que não cabe na palavra, amor que escapa à fala, coragem que foge das letras, vida que vira um universo, explodindo no gozo conjunto do encontro entre corpos e cheiros e línguas e olhares. há sopro no corpo, e, no corpo do outro, há mar, e isso basta pra fluírem os rios das veias e as linhas das mãos que caçam esse corpo-fora. o corpo é agora. palavras cansam, mas o corpos dançam.
e por mais que eu tenha querido ouvidos queridos, meu corpo vive e quer explodir. respiro, e sopro, e sinto, e sirvo, e queimo, e vôo. e se o peito se empedra, fura fundo a nova fonte que ainda pinga (mas guarda uma água cristalina, prestes a jorrar pelo mundo, pelo meu corpo, pelas pedras e palavras, nascente). se eu tenho sentido ainda, as palavras é que não tem mais. meu corpo-verdade deseja conversa com cheiro, riso engasgado entre línguas, pensamento que voa leve quando a cabeça mergulha num coração que não é o meu, mas me corrompe. falar é tentativa, amor é mais coragem. palavra não tem vida: o corpo é liberdade.

inês, sentindo o coração bater nas unhas.

domingo, 8 de março de 2015

encruzilhada

gosto quando as letras destilam sentimentos. palavra é impureza, o invisível voa longe. descem pela escrita os engasgos que eu sinto (palavra é liberdade, lança os olhos no infinito). escrevo, e algo soa: meu coração revirado se liberta das imagens, vira som, me ultrapassa. e enquanto o tempo passa, algo morre, algo nasce, e por mais que algo renasça, não há tempo que reverta um processo de desprendimento. mas sei que dei uma volta grande e voltei a um lugar contíguo àquele onde me perdi. voltei outra, mas voltei toda. senti o que realmente importa. o que era meu, botei à prova, o que era eu, mandei embora (embora eu sinta também os espinhos que entram mais fundo, o correr do tempo, o medo do mundo). ainda sou só, mas cada vez mais só sou: dividida, incompleta, presa e livre, mutável, algo perdido e algo além. vejo que estou perdendo um alguém que sou eu mesma, escorrendo quente, entre braços e cheiros que me envolvem e que me devolvem um descontrole que é existir, a liberdade que é não pensar, enquanto as palavras guardam lembranças, os sonhos trazem promessas, os sons libertam sentidos, o silêncio consome os medos, a mente confunde o corpo, o corpo confunde a mente, o cheiro tira a razão, a distância segura o juízo, e o vento revolve tudo.
queria saber o que faço com isso, mas querer não basta pra mulher enorme vivendo aqui dentro, (querendo ser plena), porque sou pequena e não meço meus passos. mas peço perdão a quem eu assusto, e é o melhor que eu faço: assumir meus embaraços, silenciar meus discursos de fuga e ouvir os descompassos do coração que ainda bate aqui dentro, e no qual nunca vou poder caminhar.

inês.

quinta-feira, 5 de março de 2015

de um amor que se foi

"baby, a vontade de te pedir desculpas, nem sei o tanto porque, (mas até sei), mas falo de novo o que quase não me canso de falar: tá certo, tenho inumeráveis defeitos, certamente em grande parte desestimulantes, mas talvez tenha algumas qualidades ocasionais... te gosto dum tanto sem medida, acho até que talvez vc não perceba o quanto a recíproca é verdadeira...
[...]
realmente não posso deixar de ver repetidamente confirmada nossa afinidade profundo, sincera e, quase ingenuamente inexplicavel... ah, pra variar, falo demais, num estado, que embora perigoso e duvidoso, é profundamente sincero... avec mon eternell amour... bisous!
sorry maybe, baby! beaucoup d'amour á toi, á moi et á nous..."

(de um pássaro amado e mais ainda amante, que se entregou tanto ao mundo e foi brutalmente assassinado por alguém sem coração.)

um irmão
(aquele que foi mais dentro e foi mais longe)
paz brutalmente estrangulada e convertida em vôo, enfim
(que nossa dor se transforme...)


inês. 

segunda-feira, 2 de março de 2015

livra

mundo cão
e eu nem quero saber que graça tem esse uso inescrupuloso do sonho do outro, pra se sentir podendo mais, fodendo escondido, vingando as próprias carências quando o outro despenca no abismo dos  próprios medos e egoísmos e egos. e no fim, o que sobra? monstros enormes, o engasgo do apego, o avesso da troca, o sufoco de um vôo daquilo que só esperou e esperou e não fez a hora de se lançar.
pra que? de novo, e de novo? o que rompe esse ciclo?
o que explode esse ego? o que é preciso deixar?
qual será o instante preciso no qual escorregamos pra dentro, ou pior, temos a ilusão de um desprendimento e uma entrega que nunca aconteceram?
afinal, é pra quê, esta vida?
é o quê, ser só? é o quê, só ser?

inês.

sexta-feira, 9 de janeiro de 2015

vai lá, sabiá

o amor de verdade passou, e eu perdi o momento, voou. meu corpo se lembra, meus sonhos se lembram de um mergulho intenso e ao mesmo tempo leve, das coisas miúdas sendo construídas, do tempo brincando na nossa cabeça. mas eu não me lembro do rosto, da voz, do gosto, do nome... não sei onde houve, nem quando, nem quanto, mas sei que se foi, como um pássaro que cantasse "mas que pena, passou na janela, entrou da janela, voou pelo teto, pousou no lençol, e ela não viu, não quis, não soube ou não viu, e agora perdeu".
e aí, eu que entenda, a vida não faz castigo.
esse mundo de olhares perdidos, desejos egoístas, de medos e solidões, de usos dos outros, dos corpos, dos sonhos, esse tanto de nãos, de descaso, desinteresse, traição, ingratidão, desconsideração, desilusão, essa saudade fudida daquela confiança amorosa que passou e eu nem vi, nem lembro e perdi, tudo isso é pra sofrer bastante, bota uma pessoa sem rumo e sem chão.
eu que aprenda a notar a preciosidade das asinhas duma mariposinha qualquer, e abrir as janelas de novo. ser eu mesma a voar lá fora, que aqui dentro não para nunca mais de doer.

inês.

quinta-feira, 11 de dezembro de 2014

i can´t breathe

depois de muito tempo esperando algum retorno de quem devia estar me orientando, percebo, então, que, desde o início, tal orientação nunca viria. mas não bastava que eu soubesse de antemão que não devia estar esperando nada: a vida quis que eu esperasse com fé, até que as desilusões atropelassem-se umas às outras e eu enfim me desse conta de que estou eternamente terrivelmente sozinha pra sempre, e não há nada que eu possa fazer com relação a isso.
aí eu tentando me libertar do ego começo a perceber que o problema tá comigo. como se alguma maldição, talvez mesmo auto-maldição-pós-trauma, quem sabe...
ou o amor não existe.
depois de muito tempo esperando alguém que se dispusesse a trocar comigo algum tempo e algum espaço de vida, ou de amor ou de beleza, percebo, já desesperosa, que tal partilha talvez nunca venha, mesmo. mas não bastava que alguém um dia me dissesse olha, você é infértil, você não nasceu para conviver nem construir nada que dure mais que quatro meses com ninguém. foi preciso que a minha carência fosse tamanha e que me cegasse e me fizesse acreditar estar construindo alguma coisa até perceber que nada nunca existiu de fato entre mim e ninguém. só ilusões, frustrações, esperas crueis, confusão.
(o amor não existe)
e, de repente, tudo de novo. flerte, corações, desejos, chamados, assédios, agrados, promessas, pedidos (ilusões, ilusões, ilusões), e eu percebo já de cara que isso tudo me dá nojo, o desejo dos outros me dá nojo, o encanto dos outros me dá nojo, me dá medo e me dá nojo, porque eu tenho um oco podre dentro de mim, um vazio que espanta qualquer um que se disponha a conhecer.
aqui, nada brota. só eu, só, a minha solidão, as minhas toneladas de desilusões e sonhos mortos, a espera por frutos que nunca nunca brotam, meu medo, e agora também meu nojo.
não há espaço pra mim no mundo. acreditei por anos que pudesse haver a possibilidade de construí-lo, mas agora me dou conta de que tudo sempre é em vão e eu nunca chego a lugar algum, só rodeio, desejo, atraio, persigo, mas no fim, não há quem me acolha, e não há quem me adentre.
o amor não existe pra mim, e talvez nunca tenha existido (ou estarei pagando até o fim da vida por ter abandonado quem um dia me amou e se abriu pra mim? eu já me arrependi. eu já sei que não se joga uma pessoa fora).
só acordos, conveniências, aparências, distrações, aproveitamentos, e descuidos, desprezos, vazios.
o mundo é um lugar incrível, mas já não faz o menor sentido habita-lo tão só.

inês, só, como sempre, e sem saída.

quarta-feira, 26 de novembro de 2014

desistência

eu nunca tive disposição pra amores sem asas.
mas depois de alguns amores doentes, covardes, egoístas, desamores - dos que tentam sempre levar alguma vantagem, seja me devorando, seja me usando e enganando - achei que talvez fosse um bom momento pra um pouco de calma, paciência, e mesmo uma certa frieza, quem sabe. pras coisas miúdas que demoram muito a crescer terem tempo e espaço pra começar a brotar. no entanto, encontro sempre pessoas tão indisponíveis, tão indispostas a se entregar ao risco das coisas ainda não estabelecidas, a perder tempo juntos, a dar um tempo da correria individual e experimentar alguns pedaços desse mundo tão grande, a compartilhar um pouco de nada, de silêncio, de sonhos, de medos, de bobagens e risos...
não que eu queira o abalar de estruturas que eu tanto perseguia antes, mas eu preciso que alguma coisa se desconstrua.
os homens... ou querendo bancar o esperto, tendo muitas mulheres e planos e projetos, ou então simplesmente elegendo uma mulher que consideram adequada pra preencher um posto limitado nas suas vidas tão importantes. o resultado é eu ficar num sobreaviso constante, uma sensação de descarte iminente de uma relação que nunca chegou a se construir, porque afinal ninguém se dispôs a abrir mão de nada pra negociar uma vida um com o outro.
sempre assim, mais do mesmo, quase bom e quase lindo, mas cuidado que não é pra valer.
com as mulheres a coisa se dá tão diferente... somos inconstantes mesmo. eu, por exemplo, desejo a sorte de um amor tranquilo, manhãs entre lençois, tardes olhando o mar, ou um bicho, quem sabe, um poema, pensando sobre um problema entre a verdade do universo e a prestação que vai vencer... desejo uma espécie de lar, que pode ser inseguro, conflituoso, hoje tem, amanhã não, depois em dobro, mas que tem alguém, que me escuta e que também quer ser escutado, e que experimenta comigo os modos como nossos corpos, e vozes, e silêncios - e livros, e músicas, e lembranças, e projetos - constroem um amor.
ao mesmo tempo, duvido muito de tudo o que é certo, de tudo o que é garantido, ou fácil, eterno, previsível. alguém que segura as pontas o tempo todo e nunca não sabe o que quer, nunca discorda de mim, me parece uma roubada, e é por isso que certas pessoas incríveis nunca conseguiram entrar no meu coração pela porta que me desmonta. solidão, ainda que do avesso. talvez eu um dia me arrependa. eu já me arrependo. mas coração é terra em que não se anda. eu desejo o infinito.
as mulheres que eu amei talvez amassem demais, mas talvez precisassem de tão pouco, mas de um modo - como é possível que eu não tenha reconhecido? - quase desesperado, que eu sempre fugi, insensível. no fundo, sempre era questão de amizade, carinho, confiança na incerteza, tempo (e espaço).
ou seja, o mesmo que eu. só que reverso. (talvez eu um dia me arrependa. eu já me arrependo.)
mas então não sei, tem coisas energéticas cósmicas, físicas, espirituais, que pra mim só acontecem entre um homem e eu, e isso me deixa inclusive mais alerta, pra não deixar desencadear isso tudo com alguém que não está disposto a compartilhar um pouco mais que alguns sábados, uma cama, alguns fluidos...
estar alerta cansa, e estar sozinha também.

inês, meio cansada da vida.

sexta-feira, 10 de outubro de 2014

lê e perde

quanto mais aperta mais ansia mais dispersa arde o olho arde a mente agoniza grifa-copia repete a linha pergunta à linha e uma pausa pro café uma pausa pra unha uma pausa pra pele uma pausa pra formiga uma pausa lenta interminável e aflita pra cada gretinha da janela uma pausa pro buraco e o buraco engole o texto e o medo engole o texto e a vida a verdade do universo a prestação que vai vencer o e-mail da avó a notícia da tortura muitos tiros muito ódio o nascimento de um rinoceronte albino a fotógrafa que captou a energia tudo engole o texto e o texto chia chia e as linhas se repetem se copiam chiam chiam e os dias fogem todos e o amor o caos as estrelas a madrugada a sujeira brincam perversos nesse quarto empestiado de nervo e cigarro e chá biscoito queijo amendoim lasanha pão laranja suco pipoca manteiga gordura sal e medo segredo torpedo desprezo desorientação e pedidos perdidos e negados e silenciosos nãos e o buraco engole tudo e o sono engole tudo e o medo engole tudo o amor engole tudo a palavra engole tudo a manhã engole tudo o sonho engole tudo o tempo engole tudo e tudo muda tudo dança tudo grita chia chia e amanhã é um novo dia e o texto me espera o texto me desespera o cigarro me alivia o buraco é alegria o amor me acelera e venha logo a primavera venha logo a nova era venha logo o fim do mundo venha logo o fim de tudo venha logo o fim do texto o fim do medo o fim do buraco o fim das pausas eternas pra tudo venha logo um novo tempo um novo medo um novo amor um novo texto novos olhos novos universos novas cartas e notícias e mensagens e palavras e prazos e sonhos.

inês

domingo, 14 de setembro de 2014

primavera e cigarros

mundo cão, e eu não consigo viver sem fechar os olhos, ou sem olhar nos olhos (aquelas coisas que parecem estar lá no fundo, ou talvez refletidas na superfície brilhante que também me olha - mas não sei o que vê, não sei o que procura, o que pensa, e nem sei mesmo se me vê ao menos um pouco, não sei se me quer, não sei o que quer) que ainda não sei se poderiam se fechar às vezes, fosse por sono ou fosse por fé
mundo bom de acabar, e eu não consigo escolher ser tomada pela espera de qualquer espécie de golpe terrível que não vai me encontrar em esquinas escuras - porque nunca estou só -, mas que da noite pro dia pode me atingir profundo de frente - porque, afinal, sempre fui só -, e sugar de novo a face florida que eu tive coragem de permitir que me preenchesse por dentro (quando comecei a comer um pouco do monstro que antes me comia). o que diabos protejo tanto?
e ao mesmo tempo - mundo velho - sou eu quem espera, sou eu quem pergunta, eu quem deseja, eu quem tem medo, sou eu sempre em tudo?
chega de mim! que o mundo é grande, é muito maior do que eu, e que toda a vida possível pode haver lá fora de mim - perto, longe, dentro, fora -, e que se dane esse devo ou não devo, suporto ou não suporto, mereço ou não mereço, quero ou não quero: chega de mim, o tempo todo. o eu que olha e que escuta já me basta, o eu que sente e pensa que sossegue um pouco, porque já sentiu e pensou além da conta pra quem mal começa a abrir-e-fechar os olhos, pra ver lá fora e não pra ver aqui dentro, mas pra não-ver lá fora, mesmo, e só ser.
(doeu, não era pra ter doído, e não era pra eu ter sentido. se eu doar, voa lá fora, vive leve, e bem maior)

inês.

sexta-feira, 11 de julho de 2014

de volta, no meio do caminho

zero ideias e tantas emoções nesta semi-babilônia, caminho dos malucos, dos bandidos e das joias, cemitério debaixo de nós que passamos olhando os becos laterais, e árvores preciosas lembrando os correres mais lentos do tempo, e que mundo de encontros... pra trás nada.

inês.

domingo, 22 de junho de 2014

sonho III: folhas

duas folhinhas pequenas (pros meus olhos). quais?
olhei pro meu pé de folha-da-costa, e tudo fez sentido. foi só colher as mais novinhas.
(só que não eram elas não. eram as vinca-de-gato que estavam do lado, agora eu sei)

fumei, a maconha. disse pra um irmão que tinha fumado, ia dizendo enquanto descia de um carro, e expliquei que não tinha me sentido mal.

meu pai... entre os arbustos... me disse que eu também precisaria "dessas duas aqui". olhei... eram como ramas de visgo, penduradas cada qual em seu pé, mas bem próximas uma da outra. apareciam como dois cachos de folhinhas pequenas, uma delas talvez com tonalidade lilás.
mas faltou-me a disciplina pra prestar atenção nas mensagens e recusar aquilo como um simples sonho louco. eu podia ter perguntado o nome delas, pelo menos. ou em que me serão úteis.
o pior: talvez eu tenha perguntado tudo, talvez meus protetores tenham me revelado os segredos que só ali me seriam revelados...
mas eu não prestei atenção. levei o sonho na brincadeira, como se sonhar fosse simplesmente um momento de repouso e de descuido, como se eu não estivesse ali diante daquilo que quando estou acordada é invisível, e em meu sono se insinua na medida em que mereço conhecer.
(quem sabe as reconhecerei quando estiver enfim desperta)

aproveitar mais essa vida, inês!

seguro-desespero

das coisas que se movem não tenho tanto medo. nem das coisas que se transformam.
tenho medo das coisas que me aprisionam, venham de mim ou venham de fora. é o que me angustia, é uma bola de neve espessa e lenta, viscosa, é a natureza de um mal que não me cabe mais. quero sair daqui, e talvez seja preciso deixar que tudo passe por mim, entender talvez com o corpo que tudo flui, tudo é haver, a vida passa e o que quer da gente é coragem.
estou tranquila, num certo sentido emocional, as frustrações amorosas, familiares, sociais, dando lugar a uma - ainda meio vacilante - paz, uma coisa tão resignada e ao mesmo tempo tão transbordante de desejo, alegria, vitalidade, levezas... só que nada disso anda sozinho, mesmo, e é por isso que tenho fumado tantos cigarros, e me recusado a enfrentar a ordem do dia sem que o medo de um amanhã tão próximo me assombre. mundo cão, também, é claro, mas o que fazer disso? sei o que é contemplar a vida com amor, mas não é pra voltar ao conforto de antes que atravessei esse caminho tão pesado de agora há pouco. preciso restabelecer alguma fé, e sobretudo alguma coragem, mesmo. enfim, é claro que os caminhos são infinitos, mas já me habita um desejo tranquilo e amoroso - como o ninar da minha mãe - de escolher um dos tantos nos quais pude escutar o bater do meu próprio coração e, enfim, segui-lo.
perdoei e pedi perdão a quem eu queria... e já deu tempo de reunir os esforços possíveis pra experimentar o novo. com muito mais cautela e muito mais amor que antes. talvez um pouco menos de paixão. talvez não.

inês.

quinta-feira, 19 de junho de 2014

irmãos

uma melancolia me abraça logo de manhã, como se eu tivesse sonhado a noite toda com uma ausência, com todas as ausências que de repente me doem, e a saudade então parece querer tornar-se um fel.
aí eu desisto do dia, recolho-me entre cartas, nos buracos intermináveis e enganosos, leio meia poesia do pessoa, e não consigo fazer mais nada. como se ninguém nunca mais pudesse me amar como nos amamos, e como se a partir de agora viver fosse um eterno lamento pelo passar dos anos, pela distância daquela alegria explosiva que tanto compartilhamos.
mas eis que alguém me sopra no ouvido que a lua está linda, que a noite existe tão viva quanto antes, tão noite quanto longe, e que cada segundo é uma nova explosão deliciosa de futuro e de amor.
saio, como antes... a ver.
e a saudade e a ausência transformam-se de amargas em doces lembranças à medida que vou percorrendo aqueles lugares que antes habitamos juntos de mil formas. como estará o zé? não tenho notícias.
e... tão logo se dá o primeiro encontro que a noite me reserva, abre-se o mundo, e meu amor transborda. daqui pra ali... uma cerveja... acolá, alguns abraços... e eis-me numa festa linda, com gente linda, num lindo quintal ouvindo lindos poemas e lindas canções... tudo novo, como se a juventude dos trinta-quarenta-cinquenta anos artísticos-políticos me esmagasse, ou antes me abraçasse como irradiação poderosa e linda de amor, de beleza, de sonho, de vitalidade e consciência.
eis aqui, mundo, um bocado de coragem.
eis aqui, tempo, um pouco de amor e de fé.

eis aqui, inês, um punhado dos seus lindos, novos e velhos amigos, que vão aparecendo no quintal no transcorrer de uma festa repleta de amor e de luz. e, quem diria... samba.

inês, corajosa, porque entre irmãos.

domingo, 8 de junho de 2014

sem casa

fui lá de novo. banhar-me de luz. e dói pra caralho a saudade daqueles dias de risos explosivos, de olhares e danças provocativos, e da doçura ácida do som que se fazia ali. o lugar ainda está vivo, ainda é lindo, mas guarda com certo constrangimento a lembrança de tempos artisticamente tão gloriosos que só quem experimentou vai saber o que foi.
e assim... sempre tem aquela presença maliciosa entre os que ali voltam tentando reencontrar algo daquele ar intenso e precioso de outrora. talvez sintamos pena por não sermos mais quem éramos, pela cena toda ter esfriado, por estarmos em tempos mais ordenados, contidos... quem sabe.
eu mesma, com muito pesar, repeli o ar de desejo galante que me atingiu.
ah não... não quero mais. já não me falta coragem, mas falta energia, falta sobretudo fé.
sinto nestes novos tempos uma onda tão forte de desconsideração, descompromisso, superficialidade, desvalor, que inclusive o próprio amor me parece mais precioso ainda. (quem sabe?)
não era tão assim... porra... troca-troca não é a arte do encontro.
se for assim eu dou mais certo é sozinha, mesmo.

inês

sábado, 7 de junho de 2014

para isa

peguei hoje em você, pelo lado de fora, pequenina.
venha logo, venha em paz, que esse mundo é bem cão mas é lindo a fuder.
deus abençoe a sua chegada. que me assusta e me encanta como uma surpresa enorme e acertada.
oxum te traga, yemanjá te empurre, omulú te cuide, ossain te abençoe, oxumare te crie, oxóssi te faça.
oxalá te proteja, ogum te guie, oyá te fortaleça, nanã te nine, xangô te oriente.
exu te mova.
pode vir, te esperamos com amor.

inês (para isa)

voando e por fora

hoje falaram seu nome na mesa e olharam pra mim.
como podem eles saber do nosso amor que só se comunicou ao mundo num sonho que tive?
estiveram eles comigo quando esta noite agora voei num avião pelo lado de fora?
saberão que hoje pela manhã esperei ansiosa e fiel que você entrasse pela sala?
mas seu nome foi tão surpresa e foi tão doce. sorri por dentro.
sei lá pra onde estou indo, pra tão longe e nem sei por que tempo, e eis que você vem pra onde moro, se adapta a meu lugar enquanto nem estou por aqui.
eu nem sei se voltaria, mas agora... voltarei? pra ver-te, definitivamente olhando noutra direção? por que fazem isso comigo? devo sonhar contigo agora?
viajar, sonhando? voltar? terei volta? vôo, e talvez volte logo, pra cuidar do gato. vôo, e talvez me perca noutras solidões.
(a minha glória é essa: criar desumanidade, sem acompanhar ninguém)
mas que não brinquem comigo. que os santos me sejam um pouco fiéis...
pra que eu vá em paz... me esqueça que enfim você veio, que vai perguntar por mim tão logo eu tenha partido. pra que eu pense que nada saiu do normal. pra que eu durma e sonhe lá longe pensando que ninguém nunca disse seu nome olhando pra mim.
mundo injusto.
te quero.  mas deus sabe o que faz.

inês.


quinta-feira, 5 de junho de 2014

dos medos que geram amor. ou: dos mestres, com carinho. ou: obrigada, deus.

eu sei o que é ter um mestre, apesar de não saber ainda ser discípula como gostaria.
as inquietações carinhosas com que fui amamentada tornaram minha vida mais especial e linda já no primeiro instante no colégio em que, fugindo de uma surda autoridade institucional, intramuros, encontrei meu primeiro maestro, que sem grades, sem horários, notas, pagamentos, fez-me abrir em admiração a um mundo que então se ofertava, mas do qual eu só distinguia sobras. e, como um cristal magnético, atraiu minha fé, minha confiança e minha plena dedicação à sua honrosa presença. mas fosse apenas admiração, amor, por sua figura, o desencanto teria sido próximo. o que ele alimentava em mim era um amor pela música, aquela que eu tinha aqui dentro, mas sobretudo, aquela que ainda estava lá fora.
eu era bem jovem e já sabia o que me prendia ali: uma fonte de luz que não me dominava, não me assustava, não me subjugava, mas sim me preenchia, me alimentava, como se precisasse que eu crescesse para que ela mesma fosse maior.

foi ficando mais fácil reconhecer os mestres da minha vida, e lamento que não os tenha reconhecido todos, lamento que não tenha passado por experiências suficientes ao seu redor, mas percebo hoje, depois que alguns outros seres iluminados ampliaram meus vôos, que é mesmo propriedade dos mestres querer que você vá embora, que procure outros, que não esgote suas forças diante de sua luz. eles fazem você querer o mundo, e seu desejo se encoraja com suas orientações.

muitas vezes há uma certa dor nessa coisa de mandar você se afastar de certo modo, ir buscar luz adiante. pode ser sem querer, e envolve uma rejeição necessária, inconscientemente forjada pra que se rompam cordões. meus mestres nunca admitiram cordões, quando eu muitas vezes criei e me agarrei neles, e me parece que quando eles sem se dar conta, iam nutrindo suas amarras, eu mesma estava preparada pra cortar com violência os laços que nos limitariam. o desapego cortava correntes, e, ao mesmo tempo, os caminhos da vida sempre reequilibraram as coisas de modo que logo era possível estabelecer novas relações e trocas, confirmar a admiração, reforçar os cortes, desfrutar dos vôos.

bem... o primeiro deles era bem velho, falava como meu avô. me fez ver o mestre em meu avô, também, e me acompanhou por anos, até fazer com que eu quisesse outras experiências musicais-afetivas-pessoais. me chamava de deusa, e me fazia estudar como o diabo. dizia com a voz e a disciplina de um oficial aposentado: ¨feliz do mestre cujo aluno ultrapassa¨, e ¨errar é humano, mas quem erra demais é burro¨. dizia que uma das coisas mais importantes do mundo era o ¨brio¨ da pessoa, e eu ao mesmo tempo deliciosamente escutava que o mais importante era o ¨brilho¨, o que sempre fez o maior sentido, mesmo.

teve outra, que por apenas três ou quatro anos permitiu-me os mergulhos poéticos até então desencorajados pela família e pela escola. ela era terrivelmente mulher, e me amaciou um pouco, tendo em troca sorvido minha rebeldia ácida.

depois teve aquele... menino... e que por muitos anos foi um segundo pai, mais honesto com relação ao risco que é viver. era de quem eu sempre esperava que dissesse se estava louca ou se estava certa, e se isso podia ser bom ou ruim. me encorajou, cortou minhas frescuras, cortou minhas tranças. me transformou completamente, me guiou a tantos - e tão longe - encontros com outras grandiosas fontes de inspiração e crescimento, que desabrochei-me em flores. antes que eu lhe agradecesse, foi ter ele mesmo com novos guias, foi voar com pássaros, ficou encantado.

do nada então me vi diante de um mestre absoluto, controverso, misterioso, que veio de muito longe e me adotou por alguns anos e me premiou e protegeu com sua companhia fecunda, intensa, espiritual e absolutamente apaixonada.

a próxima cantou como uma sereia, de um modo tão irresistível que mergulhei pra nunca mais voltar. me alimentou e encorajou quase como minha própria mãe, deslocou meus sentidos e minhas crenças, e com isso perdi um mundo em que podia ser rainha pra ganhar alguns outros tantos em que eternamente serei andarilha. e, tanto permitiu que eu ousasse, tanto alimentou minha extrema rebeldia, que, por fim, rompemos.

depois ninguém mais me adotou. ninguém me levou pra casa, ninguém me preencheu de modo tão intenso que durasse aquela eternidade-até-a-ruptura. talvez isso nem nunca mais aconteça dessa forma, agora que minha jovialidade interessante deu lugar a uma visível crise de fim brusco de ciclo profissional em descompasso com uma vida afetiva em doce infância, os sonhos a nordeste, os talentos adestrados a oeste, as lembranças todas submersas, prontas a explodir como vulcão.

mas encontro tanta maestria nas pessoas que me inspiram, que me pergunto se não estou em pleno terremoto dispersivo no mundo das minhas afetividades. e quando penso, meu deus, é incrível demais pra ser verdade, mas como pode uma pessoa como eu ter-se encontrado, de repente, em tantas e tantas e tantas e tantos encontros ligeiros e intensos, com mestres tão transformadores que com uma conversa abriam meu coração e metiam dentro dele coragem e amor, e que com os olhos e poucas palavras fizeram minha vida inteira já ter valido a pena? aí, se eu for pensar em cada um num só dia, meu coração não resiste.

inês, escrevendo dissertação, com os instrumentos guardados debaixo da cama há 1 ano, após 15 de explorações sonoras, e desejando plenos vôos.

terça-feira, 3 de junho de 2014

sangue

só faltava mesmo que, enfim, descesse tudo, e agora já não falta nada. tem uns ciclos lindos rolando no meu corpo, e que se estendem às minhas histórias, aos eus que tenho, que sou, que hei. homem não sabe não.
acaba amor, começa amor, acaba amor, sai da casa, casa nova, casa outra, sem casa, mais amor e algum dinheiro, depois contas e mais contas, o vermelho, o medo, o susto ruim o susto bom, um cachorro...
e a terra girando dentro do meu corpo, cada parte se entendendo e se desentendendo entre si enquanto vivo, nascentes de luz e escuridão que me movimentam e me recolhem, tudo isso enquanto penso que penso pra existir e ser mulher.
eu me angustio, mas meu corpo parece que sabe de tudo.
agora o grande balão de remoimentos que eu enchia sem controle aqui dentro esvaziou, parece que choveu, me sinto uma terra revirada e úmida, fértil, farta de sementes, sais, restos, desejo, fé...
só que não voltei a ser o que eu era, acho que isso nunca mais. o mundo roda e caminha, e as coisas não voltam ao seu lugar. uma coisa de que eu gostava muito morreu, e libertou-me de um vício que não me deixava perceber que eu queria lá na frente, mas não sentia a delícia do eterno preparo.
tenho um certo tesão inédito em um pouco de sangue, algum arranhão, uma mordida, de repente tatuagem. já marquei, a primeira, e já a adoro, na minha pele.

inês.

domingo, 1 de junho de 2014

sustinho

eu já queria mesmo respirar a sua pele, deixar que entrasse em mim o cheiro do seu corpo, do seu cabelo, seu suor, suas pintas, seu cangote, ai que lindo é você, e que desajeito, que desconcerto, que atropelo meu afobamento tão pouco educado, a minha fala atravessada, minha conversa avacalhada, um palavrório exagerado, e que delícia nosso delicado desencaixe, esse desconhecer que meu desejo sorve, a sua barriga lisa escondida pela camisa, os seus pés compridos lá longe dos meus, o calor das cobertas o gelado do banho mal-secado, a sujeira do banco da frente do busão e da cadeira do buteco no vestido na sua cama, e essa pureza bruta e limpa da sua saliva, doçura em hálito de cerveja, ronquinho bêbado na minha orelha, e frios na barriga cuspidos em mim pelo seu riso forte, que delícia a manhã ensolarada em volta da sua casa em volta dos seus livros e das suas ideias lindas, que delícia de café e de pão com manteiga!
é quase um milagre, mas nem me pergunto se será que vai ter mais, eu aprendi de um jeito bem doído que não é isso o que importa quando a gente se encontra, e estou sentindo de um jeito gostoso que aprendi a coisa certa, ouvindo alguma palavra sua de repente durante o dia e tentando lembrar do cheiro que senti bem rapidinho mas que me deixou bem alegrinha, me satisfez enquanto houve. é isso, só, parece pouquinho e breve, mas inaugurou-me de novo as partes doces, e que bom, obrigada!

inês, que agora celebra o desejo e ri da própria espera.

quinta-feira, 29 de maio de 2014

cheiro

espero e espero
e eis que escorre (viscosa e enegrecida) a liberdade
(de sonhos mais adiante, quem sabe amor).
posso e quero exercitar minhas palavras; não dou murros em ponta de faca, não dou bola pra atos-falhos vazios da elegância de escutas ao porvir. dou empurrões, talvez, ou quem sabe quase isso, naquilo... que também não é bem faca, cuja existência vale celebrar com o esmero de buscar um nome provisório, pois sempre poesia.
(quando estou menos preparada ele vem igual a mim ou igual ao que eu era, diferente em tudo, mas encruzilhada de campos-minados-de-bênçãos e de infinitos encontros com aquelas faltas sem fundo, as misteriosas solidões do mundo, a coisa que não desce, o balão que não estoura, a semente que não brota, amor preso num sonho esquecido)
mas escorre, com ainda mais intenso calor, e pra dentro, e sobe, fumaça.

inês, viva.

sábado, 19 de abril de 2014

eu

culpa, perdão, paz, dor no peito, fluir entre incertezas, lutar contra injustiças... mas que diabo!
tem algo diante dos meus olhos, mas meu ego inchado de dor não permite que eu enxergue nada.
cada dia é um ciclo mágico, mas meu medo das incontroláveis trapaças da vida me aprisiona nos repetidos ontens.
sim, tudo foi ruim e trágico de novo e de novo, desde então... mas não porque tem que ser, e sim porque não fiz faxina, só espanei os móveis por cima.
e, desde minha primeira certeza de que não quero mais ser tão só, nunca mais me permiti a deliciosa  fonte de luz e mudança que sempre foi estar comigo.
a ansiedade e a certeza inundaram meus caminhos, e procurei me cercar de qualquer coisa, qualquer gente... até não ver nem escutar mas nada.
falta mergulho, talvez.

inês, a quem a vida mais uma vez poupou de um repentino e deslocado filho, porque aquilo que se alimenta de amor e se liberta ainda está por vir...

quinta-feira, 10 de abril de 2014

cinzas

eu pensei muito, sofri com meus pensamentos, quis parar de pensar, esquecer, viver, simplesmente, morrer simplesmente...
(no afã de que o veneno da desesperança me abandone como uma nuvem que passa, até mesmo a morte visitou minha cabeça algumas vezes, a morte sem coragem de quem entrega os pontos, desiste)
olhei lá pra baixo, bem longe, bem fundo, imaginando se tudo seria questão de segundos, se haveria tempo pro arrependimento ou apenas paz.

em seguida me assolavam aquele velho sentimento de que a vida é mesmo uma correria, um sonho, um susto, um sopro, e o medo de que seja verdade o fato de que vai acabar mesmo uma hora ou outra, como já foi acabando pra tantos queridos irmãos inesperadamente mortos.
não quero morrer, quero viver pra sempre, ainda que com emoções tão doloridas e o coração tão desamparado, mas preferencialmente com alguma paz entre meus dias e noites, alguma espécie de resignação interiorizada diante do que parece ser falta mas não é, e um encantamento modesto diante das pequenas-imensas liberdades e belezas que me tangenciam. ou me atravessam. ou inundam, ou simplesmente se sugerem...

me perturba ainda um certo encontro místico e múltiplo, que, de repente, me deu respostas pra perguntas que talvez nunca apareçam, e que me revirou internamente de um modo tão potente e ao mesmo tempo tão invisível, que acabei me fortalecendo enquanto me fragilizava. e, de repente, do encontro fizeram-se rupturas desconcertantes, respostas aparente desconexas pra questões que lá no fundo eu entendo, mas que não posso falar...
(aquela casa está lá, enquanto estou aqui precisando e sozinha, e pegar um ônibus e de repente retornar parece ser como se eu a encontrasse demolida, escombros de um maremoto, destroços de um lar pós-tufão, ruínas, poeira, cinzas... em sonhos muitas vezes a visito, ou habito, ou simplesmente procuro, mas zelador sempre me aparece de costas. tudo é igual, e ao mesmo tempo diferente, o que faz com que eu sempre me desperte com uma nostalgia doída, de alguém que visita uma vida passada)
a falta que eu sinto é a falta de um lar destruído pra sempre. lá não é meu lugar, eu sei por dentro. já saí de lá e espero que lá saia também de mim.

meu coração está coberto de pó. eu sei.
sei que preciso sacudir tudo, lavar, deitar coisas fora, deitar o próprio coração fora, posto que se regenerará, certamente, para que eu floresça novamente, absorva luz, viva...

mas me sinto traída por deuses, e por desconhecidos estranhos a quem eu chamava de mãe, de pai e de amor. sendo que tenho uma mãe e um pai de verdade, que não podem evitar meus sofrimentos, mas que nunca aceitariam que eu fosse usada por pessoas monstruosas e más, que nunca me trairiam, e que, infelizmente, não vão viver pra sempre também. serão meus doces pais enquanto o tempo for propício, e depois se transformarão em plena lembrança, imagem, saudade... em algo que a morte fará parecer uma falta brutal, mas que o tempo (o tempo rei, passado, presente e futuro desaguados) dissolverá ainda numa energia sem mistério.

(e, ao mesmo tempo, um cachorro e um gato me olham, sempre, enquanto estou à noite me esgueirando pelas ruas. santos me visitam em sonhos, seja incorporando na minha avó no meio de uma guerra, seja de costas, sempre de costas mas com cheiro de outro mundo, seja me mostrando vidas passadas, futuras, seja dançando, seja me dizendo não.)

coisas boas virão?
eu só quero dinheiro pra pagar minhas contas. e um amor que seja doce, ou que seja selvagemente fiel, ou que cozinhe, ou que seja pescador...
a morte virá. (ela vem a todo momento, não descansa nunca de nos ceifar cômodos, cheiros, vozes, respostas, alegrias, apostas, suspiros, sorrisos, força...)
e dela eu quero que venha um pouco mais tardia do que ameaça vir, que me deixe um tempo suficiente pra me resignar de alguma forma, mergulhar de olhos abertos no lago escuro dos sonhos, ou mergulhar de olhos fechados no mar cristalino da vida, ou dormir com uma criança no colo sob uma árvore que eu mesma tenha plantado, ou aprender, enfim, a só ser.

inês.

sexta-feira, 31 de janeiro de 2014

sonho II

meninos
me encostam a ponta dos dedinhos encardidos de terra
sem que eu os veja.

logo risadas
e muitas crianças.
barriguinhas e mais dedinhos
línguas dentes
pés.
elas brincam com meus cabelos
(as meninas)
e as miudinhas, peladinhas,
trepam nos meus pés e pernas.

os adultos cantam com encantados
mais saúdealegria.

não é só sonho, é amanhã
(e cura).

inês.

terça-feira, 28 de janeiro de 2014

sonho I

numa ilha.
cais e pedras.
e havia o passar das horas. mil horas num único dia (ou mil dias numa única hora).
o verdeazul cristalino e o pôr-do-sol. era mercado. era mergulho com asas.
e havia avô, avó, primos de longe que nunca conheci.
donada eu dirigia desgovernadamente um carro antigo, pela noite. supondo seu mecanismo e com fé na trajetória. e muitas ruas, desconhecidas e luminosas. a praia longe.
um cachorro, que podia ser um gato, que podia ser um pássaro.
e minha quarta avó, ou o gato, ou o mergulhador, me disseram que eu sabia que nunca estaria sozinha. ou sempre estaria sozinha? segundo me diziam, é uma coisa que eu já sei, então não me importa o que disseram. disseram as duas coisas.
alguém me deu sua bênção, e me disse que a comida estava ótima.

outra inês.

domingo, 12 de janeiro de 2014

sobre uma visita

querida ana,

ocasiões como esta são muito especiais. é raro que possamos olharmo-nos as duas, e passar qualquer momento como este fitando este espelho cristalino e ao mesmo tempo desgastado e turvo que somos uma da outra.

estamos as duas diante de um deus impiedoso chamado tempo - esse doceamargo que alenta-nos pela manhã -, e estamos as duas cansadas de resistir a seus encantos divinos, sua potência pacificadora e ao mesmo tempo inquietante. e eu gostaria que não tivéssemos tanto medo de seus caprichos e nos rendêssemos enfim ao seu domínio, para quem sabe a sensação de soterramento se tornar a leveza que tanto buscamos em tudo.

eu sei que você era mais feliz quando não se importava com o coração das outras pessoas, e sei que o gosto dos seus olhares tem sido amargo, mas preciso lhe lembrar que felicidade não é tudo nessa vida. não adianta sair buscando por aí tão ansiosa.

mesmo que você se sinta tantas vezes um pouco menos que cada uma de todas as coisas do mundo, é importante lembrar que vivemos em mares de secura, em que o oásis profundo e farto em que nos alimentamos é o sozinho... esse sozinho que a senhorita conhece muito bem, mas escuta ainda muito pouco, e que é o silêncio e o grito do nascimento e da morte do mundo inteiro, o parto do passado, do presente e do futuro, o berço e cova onde descansa sua força.

minhas noites escritas à mão, seus tropeços bailados em vão, se esbarram nas histórias de rios e luares que escutamos nossa infância inteira, mas como se fôssemos eternas fugitivas de futuros já contados, como se não soubéssemos que tudo tem um fim, tudo morre, tudo se transforma, tudo se perde quer tentemos ou não preservar.
mas o que importam nomes perdidos, casos perdidos, laços perdidos, caminhos perdidos, trens perdidos? a verdade é que eu e você gostaríamos mesmo é de nos perder em outra pessoa, morrer em alguém que também morresse em nós, que conosco viajasse sem mapas pelos nossos próprios corpos, nossos desejos, nossos mundos, nossos silêncios e medos e fé.

mas não se encontra ninguém que nos queira de fato quando temos nossos sonhos à mostra: ninguém entra de corpo inteiro por portas escancaradas. apenas se espia e se sai... tem-se a impressão de que por ali tudo se escapa, como se não se escapasse por janelas discretas e soleiras mais doces... sobre essas partes de nós que permitimos que se percam entre tantas falhas por aí afora, são a grande contradição da vida: é se estendendo que se permitem os encontros, e há muito mais dentro de nós do que o que se vê através das aberturas, mas nem sempre o sagrado é invisível e silencioso, ele é bruto, cristalino, e muito dado a disfarces.
e não se encontra ninguém que nos queira por dentro quando não se sabe, por fé ou por lógica, que é da lama que nascem as borboletas - essas pétalas voadoras que nutrem a máquina do universo.
(o caos gera estrelas).

apreciemos com serenidade a lama e o caos que temos por dentro. cuidemos dos nossos corações, restabeleçamos nossa fé no oásis de nós mesmas. quem sabe devêssemos sentir um pouco menos as coisas, buscar um pouco menos de sentido no mundo, desejar menos que alguém queira de nós o cuidado que queremos de alguém, fechar um pouco nossas portas. não há mais sentido em conhecer tantas pessoas especiais só por uma superfície. haverá quem tropece em nossos tropeços por dentro, sem que fiquemos nos desgastando por aí afora.

acredito que este seja o começo de uma cura que talvez não tenha fim, pois isso seria o mesmo que não mais existir.

com amor,
inês.

sexta-feira, 10 de janeiro de 2014

beiras sem praia

fantasia I

donada. fui atravessada por tantos rios - fluxos que me curaram dores - e alguns pedaços foram ficando docemente pra trás, emergindo, leves, do escuro, batendo asas amarelas e interminando-me como pessoa, à medida em que descíamos e subíamos os cursos da doçura tantas vezes silenciosa dos santos e poetas e quanta. foram travessias carregadas de nãosolidões.
ver é negócio perigoso, nãover é negócio perigoso. viver é negócio perigoso, e desaguei de olhos fechados em braços que iam me trazendo pra onde o mar é doce (o sertão está em toda parte), e a estrada é linda, a fadiga fecunda, o ser não basta, tudo é real, há bem mais sois restando entre estrelas, o amor não existe e as coisas não tem nomes. e eu me perdi.
eu rio, e há alguém que me encara.
pensei que não pudesse mais ser tão atravessada.
e agora há mar, e basta.


fantasia II

ele veio como sempre de longe, como sempre com cheiro de mar, de destino, e aceitei o louco oferecimento de me abancar. (aguagem bruta, traiçoeira- o rio não é cheio de baques, modos moles, de esfrio, e uns sussurros de desamparo? eu tinha o medo imediato - e tanta claridade do dia!) ele cheirou o por-do-sol da minha pele, e senti seus poros, o sal do seu corpo, e desmaiei um pouco por dentro, e nossas peles e cheiros explodiam com as maritacas em bando.
trocamos de pele e de cheiros, e eu quis gritar. (o silêncio não me incomoda: o silêncio não existe)
eu sei que ele vai embora, sempre pra longe, sempre pelo mar. eu fico explodida de cheiros e peles, gozando nãosó, até me perder mais um pouco. de novo, só que como sempre de outro jeito.


travessia III

tentei mergulhar numa água escura, até que meus pés tocaram o barro da outra margem - que poderia ter sido a terceira, mas não era.


inês
(para iza).

quinta-feira, 12 de dezembro de 2013

cartas


carta ao monstro zed

você sabe ler, zed?
seus olhos... são de verdade?
não foi a primeira vez, zed, que um monstro me usou. aliás, já fui antes usada por monstros, por homens, mulheres, instituições, e até mesmo pelas minhas próprias vaidades, meus medos, meus monstros.
mas de certa forma, sempre houve alguma espécie de perdão, de auto-perdão, essa luz cristalina que brota dentro das pessoas que tem órgãos.
desta vez, não houve ainda palavra na sua boca, nem na boca de ninguém que assistiu à sua monstruosidade. percebi que deus coloca palavras na minha boca, mas não consegue colocar na sua.
eu sinto até que muitas vezes esse deus pode ter querido que eu sofresse, pra renascer e descobrir meus próprios monstros e minhas próprias luzes.
mas você deve ser um monstro de outro mundo... de um mundo que não consigo mais acessar à gerações, onde talvez os deuses sejam mais cruéis e permitam que se use uma pessoa até não haver mais qualquer indício de luz. acredito que os monstros desse mundo sejam tão falsos, vazios, traiçoeiros, que a gente não enxerga a pedra escura e inerte que eles têm por dentro, a gente vê neles só um espelho, de aparência cristalina e luminosa, e acredita que está olhando quem sabe pro próprio deus, pra alguém igual a gente, pra alguma coisa de saúde, de amor, de verdade. mas acho que no seu mundo não existe verdade, zed.
e o que se expôs, em nosso triste encontro, talvez tenha sido a inverdade do meu próprio deus, do meu próprio mundo, a inverdade dos meus olhos, minhas fraquezas, meu vazio. ou talvez uma verdade dolorida dessas coisas todas, uma verdade que não consegui suportar, a verdade de que monstros como você sempre vão andar por aí, sugando quem quer que os encontre e se encante por suas mentiras.
você matou minha fé. você me matou.
eu te disse que você estava me matando, na esperança de que talvez você interrompesse o que estava fazendo, mas você fez ouvidos moucos, você me devorou até o final.
eu vi que você pagou de louco, zed, eu quis contar pra todo mundo.
teve quem também tenha visto, e inclusive me alertado, mas muitos não viram, igualmente devorados pelas suas mentiras, muitos me disseram “é assim que os monstros são”... e hoje já não sei onde estão essas pessoas, porque perdi o contato de todas, parei de vê-las, e elas pararam de me ver também.
a verdade, onde está? comigo, não. ela certamente anda por aí, e de vez em quando se encontra comigo, e eu desejei que alguma vez ela também se encontrasse contigo, mas hoje entendo que ela não adentra monstros do seu mundo, que talvez você tivesse que nascer de novo muitas vezes pra quem sabe ter olhos pra enxerga-la, ou ouvidos pra escuta-la. quem sabe um dia você possa mesmo dize-la, sê-la, mas pelo que percebo, esse dia talvez ainda esteja longe... ou talvez um dia desses... você se veja num outro mundo, ou encontre outro monstro, que te faça morrer e renascer muitas vezes de repente, e então seus olhos sejam refeitos de cristal, de água, de qualquer matéria viva, mais aberta e transparente que essa superfície inerte, fria, maldosa que você expõe quando abre as pálpebras.
eu sei que se você morrer e renascer muitas vezes, vai acabar nascendo com uma luz própria, porque isso é quase kardecista, budista, hinduísta, mas acredito que é assim que as coisas acontecem.
as verdades são muitas, mas todas são uma só, para monstros, deuses e pessoas, no meu mundo e no seu, agora e sempre.
é por isso que você não diz mais nada desde que sua mentira se revelou: porque não tem verdade pra dizer, e nem deus que diga por você.
quando me pergunto que tipo de monstro você é, percebo que encontrei o monstro mais perigoso pra um ser humano: o monstro da mentira e do desejo, o monstro que desarma nosso corpo, que expõe nossos olhos e coração, que me fez de repente querer tudo, e que aos poucos me tirou tudo. você é um monstro que conseguiu me fazer não querer mais nada, a não ser morrer e nascer de novo.
quero que renasça minha luz, zed. quero que o deus que me habita não espere nada do seu.
quero esquecer você pra sempre, e não esperar que você consiga abrir a boca e dizer alguma coisa que não seja mentira, abrir os olhos de verdade.
quero mais ainda que em mim brote a luz do perdão. quero perdoar a mim mesma, a você, esse monstro que me feriu por covardia. quero perdoar a deus.
quero a luz da liberdade.
por favor suma dos meus pesadelos, por favor vá embora pra quem sabe morrer e renascer num mundo menos monstruoso que o seu.

inês


carta a deus

querido deus, eu não sei rezar. já tentei tantas vezes, já acendi vela, já fumei maconha, já cortei a maconha, já obedeci, já meditei, já dancei com índios, já chorei cantando samba, já repeti palavras, já saudei o sol, as folhas, o vento, as águas, a montanha, tudo. mas não sei se alguém já me escutou de verdade. não sei se já obtive qualquer resposta, positiva ou negativa. não sei se estive apenas tentando conversar comigo mesma.
acho que me iludi ao sentir as ondas batendo, o vento, o fogo, o amor, os sons e o silêncio do mundo, e achar que estava entendendo tudo.
porque... o que havia dentro de mim secou, e já não sei como fazer pra que alguma parte brote de novo. há algo que nasça das cinzas? nem minha mãe Iracema me contou, ainda.
perdi meu amor, minha paz, minha coragem, perdi minha casa, meus irmãos – terei perdido todos? já terei tido algum?
porque isso está acontecendo justo comigo, que sempre me senti abençoada, viva? porque eu, meu pai? me abandonastes ?
estou triste, mas muito mais do que triste, estou morta.
eu suplico, preciso que alguma coisa nasça, aqui dentro.

(nem que seja só minha fé)

inês, morta.

sexta-feira, 6 de dezembro de 2013

a deuses

viajo porque sofro, e, porque viajo, sofro.
viajo pra não esquecer
(e viajo pra não lembrar).
viajo em nuvens, cidades, países,
viajo em ondas.
viajo em pássaros, em pernas, tempeiros,
e a cada despedida carrego todas as outras despedidas:
as nervosas, as tristes, as desesperadas,
as desejosas, as pra-nunca-mais.
carrego a despedida dos parceiros do rio, correndo qual meninos
ao lado do ônibus
explodindo adeuses que alimentaram as janelas,
atravessaram os silêncios seguintes, as paisagens.
carrego a despedida dos índios, o choro daquelas mulheres,
as lágrimas da minha tia, os eu-te-amos engasgados,
a troca de bênçãos e colares, carrego todos comigo
(carrego agora este parto bruto, nesta manhã comum).
carrego, além de tudo, a falta
falta que sinto dos mares, das casas, das chapadas.
e um peso-doído de abraços, planos, sons-risadas (qualquer dia, amigo, a gente vai se encontrar).
não viajo sem bagagem.
viajar é carregar saudades e olhares, coisas do céu.
viajar é partir, é querer que o tempo corra.
viajar é sofrer o correr desabalado do tempo
(bons momentos, passem lentos).

- viajo, e sei que o tempo voa assim como eu. parto, e a vida revela-se rara. sofro, e desejo partir ainda mais -
porque viajar é (se)(re)partir, e partir é sofrer, é um tipo de explodir, um jeito de ser inteiro
- é sofrer encontros, que já são em si violentas sementes de ausência. a violência do tudo e do nada, de apenas ser.

inês, numa manhã de adeus na bahia.

classificados

procuro um homem que às vezes me cale.
que não tente bancar o esperto, e que, ao me abandonar, me avise.
procuro um homem (que coma minha comida, ou cozinhe comigo, ou me faça um drink, ou leia um poema, ou que conheça boas músicas).
procuro um homem que vá comigo à praia, que saiba o que é solidão, e que goste de plantas, ou de gatos, ou de quadros, ou montanhas, ou de poemas, de filmes, cidades, de histórias sobrenaturais.

procuro um homem que me procure, um homem que às vezes me escute.
e que me faça rir, ou que ria comigo, ou que ria de mim.

procuro um homem que me perdoe, e que peça meu perdão.

inês.

terça-feira, 29 de outubro de 2013

jeito: mente

seduz
mente
usa
mente
troca
silêncio.

canalhice
silêncio.

é só seu jeito, tenho mais é que entender que as pessoas são diferentes...

inês, cujo coração vai explodir, literalmente.
(e você, cínico, preocupado com meu cigarro)

quinta-feira, 24 de outubro de 2013

mortalha do amor

um dia nasce, assim... tão bonito...
e sem saber tá ferindo a gente!
não suporto mais me fazer mal, não suporto mais me afastar, não suporto mais não entender!
no entanto suporto...
como pode esse tal coração doer de verdade?
como pode de repente um tanto de soluço engasgado, um dia inteiro e depois uma noite inteira e depois mais um dia inteiro - dourado, primavera - com esse aperto terrível no peito?
como pode essa tristeza? num dia desse, como pode?
o tempo passa, e eu continuo pior. eu acho que eu melhorei, mas continuo pior. é tudo triste, embora seja mesmo lindo como eu sempre soube que era.
eu sei que tá errado, mas nada agora faz sentido.

inês, ferida de mortal tristeza.

terça-feira, 8 de outubro de 2013

vou

eu já me sentia escorrendo aos poucos não era de hoje, e pra lugares que sei menos... mais distantes do que a terra do sol e dos cheiros.
pra lugares nada familiares (olhares novos que hão de nascer em mim)

agora parece mesmo que vou.
(parece mesmo que vôo.)

vai saber. mas já olho meu redores com adeuses secretos... e pego-me desapegando-me de tudo o que vai passar. e já doi. já é tarde demais, e o momento é agora. não entendo (mas vôo).

(daquela casa que não sei de que modo me quer nem porque me recebe: só o amor aos santos me fará passar por isso mais algumas vezes. olhar sem nojo a face da maldade e me fortalecer, até encontrar um lugar com alguma paz: o perdão da distância.)

e das coisas que importam - que não encontram-se vivas em cada lugar e instante do mundo... vó e vô me esperem, que ainda não é hora de virar tudo saudade. pai, mãe, não posso pedir que me esperem... que ainda não é hora de virar tudo saudade... mas vou!

inês.

sexta-feira, 20 de setembro de 2013

ser

ouço um vento, aqui comigo. vento interno, violento, que foge pelos meus poros, pela minha boca, pelos meus olhos, e me carrega praquela distante paz diante do revolto encontro entre o mar e o céu, encontro azul entre o profundo e o infinito, o cristalino e o escondido, que me alenta e me transforma no grão de areia que sou. lá, minhas pretensões, meus juízos, minhas desilusões, se transformam em vozes miúdas, em impotentes dores surdas de quereres triviais: trago em mim um algo a mais, que sossega minha fuga inglória, que me traz de volta pra dentro, pra explodir em ondas de vento. e quem sabe ainda haja tempo pras ligeiras alegrias, pras certezas fugidias brincarem no meu ori. eu sei que estou aqui, mas minha mente está lá longe, buscando uma paz que se esconde nos mais doces manguezais. sou um rio que corre pro mar, uma estrela ensaiando um luar, mas caindo pra sempre num nada, pra compor tudo o mais que existe: eu sei, a existência é triste, mas a eternidade é linda, é como esta noite, que finda, numa explosão de pássaros-tons. e é pra isso que existe o samba, pra lembrar que é o tempo quem manda nos caminhos do nosso ser. a poesia é tudo o que resta - pra quem chora, sorri ou contesta - e a sábia cadência do mundo, a batida de cada momento, transformam e vida em verso, convertem desejos em vento, invertem todo o universo!

inês.

longe

cheia lua, lá no alto,
toma meu corpo de assalto
e me põe a caminhar

viajo, num mar de saudades
sem saber o quanto é tarde
pra buscar um porto, e ficar!

estou só, e no relento,
abraçada pelo vento
pelos beijos do luar

lua grande, a senhora
sabe bem o quanto demora
minha espera pelo mar

me rodeiam corpos estranhos
e um desejo sem tamanho
por um cheiro familiar

(aquele, de algas e sal
de um além tão colossal
de um alento libertador...)

lua cheia, estás comigo,
como o céu, que é meu amigo,
como as ondas, meu amor!

inês, que escoa.

terça-feira, 10 de setembro de 2013

samba em cores

não mais que de repente
sua estrela me ilumina
a noite desatina;
você só me traz paz.
minuto precioso,
um encontro neste mundo:
seu ser é um segundo
(a mais...)
 
tão longe brilham astros
tão raros nossos abraços
(iluminosos passos
com sua voz)

há força entre nós
(nascida em nossos avós):
sagrada brincadeira
(de estrelas da vida inteira)
descuido atencioso
que escapa, precioso
entre palavras e fé

poetas saberão
o que essas horas são
trocadas de repente
aproximando a gente

e muitos são os olhos
e tantas são as mãos
que guiam nossos sonhos
em oração!

sabemos nós o quê?
vivemos nós de quê?
(da força das sementes
em tudo o que há na gente:
de chuva, luz, e terra
querer!)

se dói não ter saudade,
na vida nunca é tarde
unir-se em homenagem
a ser, e só!

se o verde é um broto do preto
(segredo de ancestrais),
meu amarelo é ouro
é sangue dos mortais...
abraça-nos o branco
que entrega, que irradia
pra fora, a luz do dia,
pros outros, alegria,
pros mudos, poesia,
pros loucos, melodia...
e em nós não retém nada:
ilumina nossa estrada
(pra além dos quereres normais)
pra outros carnavais!

beijos da inês.

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